A prática mística que precedeu a anestesia médica

Antes de o éter e o clorofórmio tornarem a anestesia cirúrgica comum, houve um movimento na comunidade médica europeia para popularizar uma prática espiritual semelhante ao hipnotismo que, segundo eles, permitiria aos pacientes uma experiência cirúrgica sem dor.

Chamava-se mesmerismo, um fenómeno pseudocientífico que envolvia a crença de que todos os seres vivos estavam rodeados por um campo magnético invisível, ou força, que podia ser manipulado para produzir vários efeitos, incluindo a cura física. Uma vez hipnotizados, os indivíduos entravam num estado de transe. A sua primeira utilização em cirurgia foi relatada em 1829, quando um cirurgião francês terá realizado umamastectomia numa paciente hipnotizada.

Por mais improvável que pareça agora, a prática não era apenas uma moda passageira. Durante um curto período de tempo, o mesmerismo foi aceite pelos médicos tradicionais como uma ferramenta legítima que poderia fazer avançar o campo da cirurgia, proporcionando uma experiência sem dor para o paciente. Revistas respeitadas como a Lancet As demonstrações da prática em hospitais-escola atraíam multidões que lotavam as salas de cirurgia.

O movimento foi liderado por John Elliotson, um importante médico do University College Hospital, em Londres, que também ocupava um prestigiado cargo de professor na escola de medicina da Universidade de Londres. Elliotson era conhecido por ser uma espécie de progressista - foi um dos primeiros médicos a defender a utilização do estetoscópio.

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    Elliotson foi influenciado por um francês de visita chamado Barão Dupotet, que alegadamente usava o mesmerismo nos seus pacientes há mais de vinte anos e afirmava que o tinha usado para curar a epilepsia e outras doenças. Elliotson e Dupotet começaram a tratar Elizabeth O'Key, uma empregada doméstica com epilepsia. A dupla terá efectuado uma cirurgia bem sucedida ao pescoço enquanto O'Key estava num sono mesmérico.Elliotson prestou consultoria em várias cirurgias utilizando o mesmerismo como anestésico, incluindo um paciente cuja perna foi amputada na coxa.

    Mas Elliotson tinha um inimigo entre os seus colegas do University College Hospital: Robert Liston, um cirurgião igualmente distinto que era conhecido pela rapidez com que operava. Afinal, antes da anestesia, realizar cirurgias rapidamente era o principal remédio para procedimentos dolorosos. Liston, que mais tarde viria a ser o primeiro na Europa a utilizar éter como anestésico cirúrgico, convenceu opara proibir a prática do mesmerismo e levantou suspeitas sobre o trabalho de Elliotson na comunidade médica.

    Elliotson defendeu firmemente o seu trabalho, apesar de isso lhe ter custado o emprego e a reputação. Mas as revistas médicas que tinham relatado sem fôlego as demonstrações cirúrgicas em pacientes hipnotizados deram uma reviravolta, denunciando a prática como charlatanismo.

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